O consultório ginecológico é um ambiente onde você se sente amparada e segura ou rola uma apreensão diante da dinâmica da consulta? Se a segunda opção está mais próxima do que você imagina ou do que já passou, se liga na troca de ideias que tivemos.
A ginecologista, obstetra e sexóloga Fátima Duarte acredita que é preciso entender o quanto cada corpo é único. Desde o tamanho de um seio em comparação ao outro, aos pêlos pelo corpo e até em relação ao ciclo menstrual: há um caminho que precisa passar por informação, por diálogo, pelo respeito aos direitos sexuais e reprodutivos. “Precisamos democratizar conhecimentos de maneira multidisciplinar. Isso deve envolver uma série de profissionais. Todas as pessoas precisam se abrir para essa construção, para enxergar a mulher como um todo”, diz a médica, que há sete anos está à frente do projeto Sábado Sem Barreiras, dedicado à saúde de mulheres com deficiência.
Nessa jornada de se conhecer e de fazer as próprias escolhas, a estudante de pedagogia Mileni Natalie conta como prefere ser atendida: “No meu caso, me sinto 100% confortável me consultando com uma médica mulher, não desmerecendo os médicos do gênero masculino, mas me sinto segura”. Outro ponto importante para ela é poder estabelecer um diálogo sobre sua própria sexualidade. “Sempre deixei claro que só me relacionava com mulheres. Acredito que as mulheres estão se sentindo mais confortáveis para falar da sua sexualidade.”
A obstetriz e ativista pela educação sexual Lucila Pougy realiza há dois anos a oficina sobre o tema Meu Corpo No Papel, voltada para jovens do ensino médio de escolas públicas de São Paulo, e concorda com Mileni. “Acho que é uma geração mais aberta, mais fluida, que se sente estimulada ao conhecimento e que interage bastante. Recentemente, dei uma atividade num grupo onde havia uma menina trans, que era curiosa, participativa e, principalmente super acolhida pelos colegas. O que sinto que ainda há muitas dúvidas, não apenas das jovens quanto das mulheres experientes. Por isso, é muito importante que a gente converse abertamente, reflita e pratique uma rotina de cuidados”, conta.
Desafios
“Acredito que é fundamental um olhar cuidadoso no atendimento clínico protetivo, seja ele de rotina ginecológica ou um pré-natal”, sugere Julieta Jacob, mestra em Direitos Humanos pela UFPE e autora do livro Tuca e Juba – Prevenção de Violência Sexual Para Adolescentes. Ela lembra que as diversas necessidades e particularidades das mulheres devem ser atendidas sem julgamentos.
Um ponto importante é visibilizar as pessoas trans que procuram ginecologistas tanto pela saúde quanto pela construção do universo simbólico em que estão inseridas. O profissional médico precisa saber como fazer perguntas de maneira que se estabeleça a confiança. “A abordagem heteronormativa e cisgênera é autoritária. Eu acho importantíssima a construção de uma ginecologia mais atenta, que olhe para pacientes como um todo”, acrescenta Fátima Duarte.
Tamo junta

Há também uma série de ferramentas que podem ser acessadas para se chegar a um consultório médico sem tantas inseguranças: rodas de conversa, redes de apoio e aulas interdisciplinares sobre corpo e sexualidade. Alyne Ewelyn Santos é bióloga, grafiteira e militante movimento LGBQTI. Participa da Liga Brasileira de Lésbicas e Bissexuais, do grupo Bisibilidade e de coletivos negros no Rio de Janeiro. “Discutir os direitos sexuais e reprodutivos é essencial, especialmente para mulheres negras”, afirma.
Alyne ressalta que a combinação de um bom atendimento com informação e autonomia podem ajudar a mudar uma realidade no Brasil: a gravidez não intencional na adolescência. Ela pode ser evitada com a orientação de ginecologistas e de outros atores que fortalecem a rede de atendimento aos jovens.